05 abril 2006

A Geração Copy Paste

Vou cometer um crime de lesa Majestade, não fosse eu um monarco-anarca, vou criticar a cultura Internet. Hoje tive a minha primeira experiência de cultura Copy Paste. Cedi a utilização do meu acesso à Internet a uma jovem estudante da Faculdade ou curso Politécnico para que ela pudesse fazer um trabalho sobre o Parque Natural da Peneda Gerês.

Ela chega a minha casa e tudo o que traz são três disketes e uma pequena pasta A4 com meia dúzia de folhas. Livros, cadernos de apontamentos, estojo com canetas ...népias.

Sentamo-nos e eu, ingenuamente, começo a entrar num apontador, escolhi o SAPO por ser nacional, primeiro erro.
- Não usa o Google ?
- Ok, Ok, vamos usar o Google.

Descobrimos os sites que interessavam e rapidamente ela começa a fazer Copy Paste das fotos e de partes dos textos. Segundo erro:
- Não convém ler o texto para saber o que lá está?
- Sim, sim, depois “componho” o texto.

O trabalho era extenso, descrever os monumentos e fazer um roteiro do Parque. Retiro-me da sala, verificada a enorme rapidez com que ela fazia o dito Copy Paste.

Uma hora depois aparece-me na frente. Fiquei impressionado. O trabalho estaria feito?
Terceiro erro:
- Acabou o trabalho?
- Acabo o resto depois, é só compor o texto no PC lá de casa.

Estou abismado, um trabalho de pesquisa que deveria pôr em contacto o aluno e o objecto de estudo foi feito a centenas de quilómetros do mesmo. O trabalho de recolha e compilação da informação foi feito em sucessivos Copies Pastes.

Não creio que alguém consiga reter metade da informação obtida desta forma. O esforço para escrever um texto minimamente original terá sido zero, portanto, as capacidades de expressão em Português nem sequer foram postas à prova. Acredito que o amor e o carinho pelo referido Parque será tão grande quanto se o trabalho fosse sobre as migrações de minhocas na Meia Praia.

Imagino a quantidade de alunos que fizeram o mesmo trabalho baseado nas mesmas “fontes”. As capacidades de trabalho em equipa foram reduzidas à sua expressão mínima, um teclado e um aluno.

Fico abismado, quando a grande evolução da educação em Portugal, passa pela colocação de um PC em cada sala de aulas, será que é para facilitar o Copy Paste? Será mais uma daquelas métricas fantásticas da CE que nos fazem subir nos rankings Europeus? Onde ficou aquele processo de maturação e assimilação do conhecimento?

Há um ano atrás, assisti a uma conferencia sobre Educação dada por um professor universitário, não era um pedagogo, era um pai preocupado e atento que tinha a experiência de quatro filhos e algumas centenas de alunos todos os anos. As conclusões foram curiosas. Os novos meios de informação não aumentam a assimilação da mesma, estou a falar da Internet e da Televisão. Antes tornam os alunos em meros espectadores ávidos de novidades, mas completamente isentos de opinião. As opiniões são as transmitidas pelo respectivo programa ou site consultado, chave na mão. O trabalho de ler um livro é substituído pela consulta de um qualquer resumo na Internet. A ida a uma biblioteca com o respectivo trabalho de pesquisa e cópia dos dados necessários para a elaboração do trabalho, uma afronta e considerada uma perda de tempo. Mesmo os considerados canais “educativos” dada a sua óbvia necessidade de meios financeiros, somente passam programas que atraiam espectadores, pelo que passam sistematicamente a tripla de sucesso, vulcão, tubarão e furacão.

Aquando da implementação da TV por cabo em Portugal, o grande argumento para a sua aquisição seria a variedade de programas que seriam disponibilizados. Errado, está provado na casa de todos nós que o que acontece é que cada um escolhe o seu tipo de programa favorito e passa todo o seu tempo disponível a ver mais do mesmo. O caso paradigmático será o canal SportTV.

Eu sei que este tema não é novidade para ninguém, mas não será esta uma causa endémica para o nosso gradual desfasamento da Cultura e da Política? Somos mais espectadores e menos intervenientes, somos mais passivos e menos activos. Estamos a criar gerações de espectadores com menos opinião e menos capazes de lutar pelas mesmas, somos ao fim ao cabo, menos Cidadãos.

13 Comments:

Blogger Isabela Figueiredo said...

Sim, isto é verdade. Hoje em dia, nas escolas, não é útil pedir trabalhos para fazer em casa. Não são feitos, são apenas copiados. Neste aspecto a net não ajudou.

12:28 da manhã  
Blogger Teresa Durães said...

Há dois métodos de criar uma geração ignorante: retirando-lhes informação ou dando-lhes informação a mais.

Neste caso, damos a mais.

Roberto Carneiro, ex Ministro da Educação, anda (ou andou) pelo país a realizar Seminários (assisti a um na Gulbenkian) a defender que se deve retirar no 1º Ciclo os cadernos e os livros e substituir por um portátil. Juntamente com ele vai a PT e mais uns grupos económicos de grande poder.

Fiquei chocada, indignada e revoltada com o que ouvi.

Quando se chega a uma era onde tudo vale, o que interessa é facturar, copy past não me parece mal.

Na faculdade tal era a quantidade de trabalhos necessários a apresentar (não sei em nome do quê porque muitos nem eram corrigidos com olhos de ver ou contados para avaliação) que, entre 1987 e 1992 esse copy past (não com esse método pois a internet não existia) era muito eficaz.

Contudo às vezes a intenção não é o trabalho em si mas obrigar o trabalho de pesquisa.

O meu filho anda no 8º ano e com a carga horária que tem, com as disciplinas inúteis que tem como área de projecto (onde nada de jeito se faz) não o poderia levar a mal se fizesse o mesmo (que provavelmente faz) pois não tem tempo para nada.

10:41 da manhã  
Blogger Out of Time said...

Teresa,
Não entendo a sua opinião, por um lado fica indignada com o fim dos cadernos porque esta prática é defendida por um grupo empresarial, por outro acha correcto a utilização do copy paste.
Convenhemos que a pesquisa em si mesmo só tem fins educativos se o objectivo for a obtenção de metodologias de trabalho. A introdução da Internet elimina um pouco essa necessidade, diguemos que secundaria, mas deveria obrigar efectivamente a estudar o assunto em causa. Ora o que acho que se verifica é a subversão do principio, o conhecimento é secundarizado em detrimento do correcto "motor de busca".

11:09 da manhã  
Blogger Teresa Durães said...

Posso não ter escrito da melhor forma (acredito) mas tentei mostrar dois lados.

(a minha indignação quanto ao fim do caderno tem a ver com a leviandade com que se faz. Segundo a teoria da evolução, embora não saiba se já está em causa ou não, a evolução do homem começou com o desenvolvimento do polegar - o que o separou do macaco. Ao instruir crianças através de um teclado em vez da utilização da motricidade fina a questão é - quais as verdadeiras consequências no desenvolvimento do cérebro?)

Quando falei em copy past em relação ao meu filho foi pelo facto de ele no 8º ano ter imensos trabalhos para apresentar, um horário carregado e sem tempo para ter 13 anos.

Não fique indignado comigo. Pessoalmente sou contra a não aprendizagem e a caça à nota.

(o meu filho leva cada sermão em casa que tive de me moderar antes que a relação mãe-filho ficasse deteriorada)

Provavelmente o meu comentário foi escrito de uma forma apressada. Peço desculpa. Estava mais a querer chamar a atenção que talvez o copy past não seja só por falta de vontade de aprender mas também por falta de tempo. E que a sociedade a tudo leva a isso.

1:57 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Um post muito interessante. Dá que pensar. De qualquer das formas julgo que a «informação» será demasiada e terá um sentido perjurativo como o mencionado «copy paste», em detrimento da capacidade anlitica e critica se nós o deixarmos... Não tenho a menor ideia da idade das pessoas que aqui comentaram, mas partindo do principio que não fazemos parte destas novas «gerações copy paste», sem duvida que nos cabe a nós guia-los no meio desse mundo de informação que é a net e outros.
Assim como ensiná-los a ser criticos, incisivos, claros, analiticos... Pudemos ir muito mais longe, ensiná-los que para além dos game-boys, playsations (que tambémmm é tão apreciadooo pelos pais das ditas gerações «copy-paste)o prazer de ir ao cimema, ao teatro, ver um museu...
Temos tão pouco tempo não é???
Por mim quando algo falha bato com a mão no peito e digo «Mea Culpa, Mea Culpa».
Sou uma optimista e tento ver uma oportunidade em tudo...
Peço desculpa acho que me estendi um pouco no comentário...foi apenas porque o «post» me deixou a pensar.
Cumprimentos da Princesa

3:47 da tarde  
Blogger setesois said...

Gostei muito de ler este post. É-se facilmente levado a concordar. E isso levou-me a pensar (efeito raro em muitos dos blogs). Ah, esta geração e os perigos de passividade da net ou da televisão. Mas... quem nunca copiou uma frase dum livro ou uma citação sem as respectivas actas? Recordo que na faculdade apresentei numa aula um trabalho sobre um livro que não tinha lido. Interessava-me tanto como o Parque interessa a essa jovem.
A questão é se a jovem faz isso com todos os trabalhos. A questão é se as fontes são devidamente registadas.

12:57 da manhã  
Blogger Teresa Durães said...

Concordo inteiramente com a MW.
Com também a minha falta de tempo nem estruturei as ideias para um comentário.

Mesmo assim até ao ano passado consegui horários reduzidos para acompanhar os meus filhos, agora já não. Para isso necessitei de optar entre carreira/a minha realização pessoal/filhos. Pensei e optei. Agora já não posso optar.

Consegui o fazer porque decidi, também, ser funcionária pública (FP) pelo facto de ter filhos.

Com FP pensei que tinha mais tempo para os miudos (não é de todo verdade mas, adiante).

(quando digo mais tempo é mais uma hora/dia)

O que queria expressar era: não criem rótulos para esta geração como criaram para a "geração rasca", ou a "geração hippie" ou seja lá o que for.

Para todas as gerações existe um motivo que os leva a serem assim. Eu vejo o desespero no meu filho de 13 anos a vir da escola, desânimo, com as controvérsias, pois os professores andam zangados (e com razão) com o ME, os alunos sentem e sentem-se injustiçados (com razão), os pais vêem e zangam-se (com razão) e estão todos com razão.

Sobra só a confusão de programas mal feitos, mal estruturados (quiçá?) para a sociedade estranha e veloz de hoje.

1:44 da tarde  
Blogger marta r said...

Tenho um sobrinho adolescente que só funciona nestes moldes. Copy Paste é tão natural para ele como para nós era requisitar um livro na biblioteca. Quem disse que em tudo mudámos para melhor?
Entendo perfeitamente o espanto e a preocupação.

5:26 da tarde  
Blogger Teresa Durães said...

O meu filho, como já referi, também faz copy past, por certo. Não garanto.

Olhem, para que não sejam tão críticos (é facil ser-se crítico)

Vão ver se têm curiosidade o que pode fazer um adolescente

http://davidblog.blogs.sapo.pt/arquivo/2005_12.html


Está lá o curriculum dele incompleto.

O que quero dizer com isto é, não coloquem rótulos nas pessoas com essa facilidade. Tenho 36, também posso dizer que as pessoas da minha idade são todas fúteis, incultas, os de 25 anos conservadores e burros. è o que observo. Aliás, posso ainda acrescentar que os de 25 vieram da geração rasca. Ninguém gosta deste género de coisas.

Foi isto que quis dizer. Mas vejo que a mensagem que tento transmitir não pega. Insistem em dizer que a culpa é deste e daquele. Nada como arranjar um culpado. Com culpados não precisamos de por mãos às obras. Tão simples, não é?

Tudo é simples :(

7:50 da tarde  
Blogger Out of Time said...

Teresa,
Calma, não estou a pôr rótulos a ninguém. O título do texto não pretende homogeneizar toda uma geração. Como em todas as gerações existem casos e casos e não estou a chamar ignorante a ninguém, estou a constatar uma tendencia para a qual devemos estar alertas, só isso. Se a ponho a pensar nos casos que conhece já me dou por satisfeito, quer dizer que o texto cumpre a sua função, alertar, sem ter grandes pretensões.

11:29 da tarde  
Blogger Teresa Durães said...

Também estava só a alertar para o mesmo porque um dia alguém chamou Geração Rasca e agora todos chamam o mesmo aos que agora têm 20's e alguns anitos.

E tenho a certeza que meia dúzia que estavam em frente à asembleia da República, por um que desceu as calças, não podem, não devem, ter esse título.

Sabe, odeio rótulos. As pessoas são pessoas. nâo são estatísticas

12:53 da tarde  
Blogger Teresa Durães said...

ah!, desculpe a insistência, o próprio título estava a generalizar

12:55 da tarde  
Blogger ordePadamaR said...

Pois caro OutofTime, tem razão em algumas coisas sim senhor.

Lembro-me que quando apareceram as calculadoras científicas, aí pelo meu 9º Ano de escolaridade, desaprendi calcular manualmente a raiz quadrada.

O que me preocupa, não é tanto a questão do Copy-Paste, mas mais a criatividade, o desenvolvimento de capacidades de comunicação verbal ou escrita..como também refere. Por outro lado, conforme refiro no meu humilde espaço, o que mais me inquieta são as referências culturais da malta mais jovem. É que sem referências, não existe cultura. O exemplo, porventura mais gritante, é a música. Repare que com esta cultura de Mix e Remix, de repente estou a ouvir uma nova versão de Coltrane ou Miles Davis..e esta malta diz que aquilo é DeepDish..nem sabem de onde vem.

Mas também não é a Internet a culpada..até porque ela acaba por proporcionar um gigantesco repositório de informação e conhecimento. Hoje é tudo mais rápido e repare, se mudarmos os parametros que avaliam o nível cultural de uma pessoa, colocando por exemplo o uso de tecnologias como factor relevante na avaliação, muitas das pessoas com 30-40-50 anos e uma cultura e experiência enorme, não passariam de analfabetos.

Que o bom senso prevaleça e sejam feitas as correcções ao uso contraproducente das tecnologias. É o que tento fazer com os teens e "20-30 something" que cruzam o meu horizonte.

8:25 da tarde  

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